O mundo mudou, muitas coisas mudaram, mas algumas outras continuam do mesmo jeito. Uma delas é o instinto de sobrevivência, de procriação, de demarcação de territórios e de obter alimentos.
No passado, segundo alguns antropólogos, alguns hominídeos usavam a clava, um porrete enorme de madeira como ferramenta de ataque e defesa para obter o que queria. A depender do tamanho do indivíduo e de suas habilidades com a clava, esse objeto poderia ser usado também para subjugar oponentes, conseguir mais esposas, mais territórios, mais alimentos e mais respeito do grupo.
Com o passar do tempo, vário objetos substituíram a clava. Um míssil transcontinental poderia ser o exemplo máximo que alcançamos hoje em dia a esse respeito.
Há porem outras ferramentas que tem sido usada ao longo da história e que tem um poder maior e mais duradouro do que esse antigo porrete de madeira. Com ele também é possível subjugar oponentes, conseguir mais esposas, aumentar territórios, controlar a produção de alimentos, e impor respeito de modo forçado aos outros. O peso dessa ferramenta depende muito da ingenuidade alheia e o efeito do seu impacto varia de acordo com a ignorância de quem recebeu a “pancada”. Quanto mais ingênuo, amedrontado e ignorante for um indivíduo mais efeito surtirá sobre este o peso dessa clave.
Desde quando passamos a viver em sociedades, não possuir determinados objetos ou características físicas, significava não ter sucesso nas conquistas pessoais e nas caçadas em busca de alimentos. Quanto a isso também muita coisa não mudou. Um pênis pequeno e seios minúsculos por exemplo, sempre foram motivos de fazer com que indivíduos ficassem para trás na hora de escolher ou serem escolhidos por parceiros para acasalamento e construção de família. Em nossa sociedade atual, isso pode ser substituído por coisas grandes como carros, casas, iates, mansões (tudo grande) ou muita grana.
Apesar de nossa sociedade se considerar evoluída, ainda há algo que pode causar tanta vergonha nas pessoas quanto não ter um grande órgão reprodutor, seios fartos ou muito dinheiro para compensar tudo isso. Esse algo se chama a falta de fé em deus.
Numa sociedade teísta, acusar uma outra pessoa de não possuir deus é tão humilhante e degradante quanto era dizer no passado que uma mulher era infértil ou que um homem era sexualmente impotente ou incapaz de proteger a própria família.
Desde que a ideia de deus foi apresentada como forma de escapismo ou solução para os problemas pessoais e sociais, todos querem ter deus, por que ter deus é algo simbolicamente bom. Serve como amuleto de sorte, como escudo para se defender dos inimigos e das “recalcadas”. Serve como forma de terceirizar suas responsabilidades e também como uma grande clava, para que do modo mais gentil possível possa-se fazer com que outros indivíduos se submetam a ti e te ofereçam de modo espontâneo parte de todos os seus recursos por tempo indeterminado. Grande evolução da clava, não acham? Uma clava invisível, com efeito capaz de afetar pessoas à longa distancias de espaço e de tempo.
A ideia de deus também é um dos caminhos para aceitação coletiva nas maiorias dos grupos sociais das sociedades ocidentais. Não ter fé em deus é sinônimo de impotência extrema, é algo “broxante” nas relações com pessoas criadas no conceito de fé desde o berço, e o único “viagra” capaz de melhorar essa situação é confessar de modo público que você também tem fé nesse ou naquele ser invisível. Fica mais evidente sua fé se você for capaz de entrar em guerra contra tudo e com todos para defender essa ideia. Isso causa a mesma impressão que aqueles brutamontes causavam ao soltarem urros bater nos peitos. Hoje brigar pela ideia de deus é como um êxtase, que eles costumam chamar de unção do espirito
Nem que você seja um hipócrita, um leviano, um desumano, um desordeiro, um homicida, um pedófilo... não importa se todas as suas falas ou seu modo de vida de modo geral seja antagônico a ideia do sagrado, diga apenas que acredita em deus e tudo se resolve e todos irão te aceitar! Você vai conseguir manter estáveis suas relações com a maioria dos indivíduos mesmo que você seja uma ameaça para a sociedade local. Esse tipo de relação assemelha-se aqueles fetiches entre casais que decidem usar consoles para apimentar suas relações e satisfazer um ao outro só naquele instante. Ambos sabem que na realidade não possuem aquele objeto desejado, mas para um prazer momentâneo entre quatro paredes é o suficiente.
Assim também funciona boa parte das relações teístas: não importa se seu parceiro é o líder do crime organizado, responsável pela execução de centenas de pessoas anualmente e todo o caos social provocado. Não importa se ele é o comandante principal da quadrilha dos engravatados que rouba a nação inteira. Não importa se é um molestador de criancinhas ou estuprador de carteirinha. Se ele disser que crer em deus, tudo fica tranquilo e o sujeito vai dizer: “ah, que bom, ainda bem que você não é ateu”...
Nesse estilo de construção social, a capacidade de acreditar em algo sobrenatural é mais valorizada que as habilidades técnicos cientificas dos indivíduos, e mais valorizada ainda do que o mérito que um indivíduo adquire por sua conduta moral ou por serviços prestados. Tanto é que alguns dos indivíduos mais bem pagos em nosso país usam a fé como clava para subjugar as pessoas e pelo poder dessa clava são bem remuneradas. Alguns grupos até imitam certinho os homens primitivos, produzindo sons guturais e ininteligíveis para se comunicarem em reuniões sociais e expressarem o quanto “estão cheios” de poder do além.
Os tais indivíduos, apesar de viverem na era da comunicação avançada, deixaram de dizer uga-uga como faziam no passado e passaram a dizer xiribicanta, ripalapatrás, e tantos outros sons frutos de glossolalia que nem eles mesmo sabem o que estão dizendo. Algumas “fêmeas” do grupo, até reproduzem uma dança semelhante a danças antigas de acasalamento, batendo cabelo, girando em círculos e soltando urros misteriosos.
Uma clava, uma fé e um alvo a ser atingido. Pessoas modernas, hábitos antigos e os ciclos se repetem. Quando se tinha a intenção de deixar uma pessoa impotente era só lhe tomar a clava. Hoje se quiseres deixar uma pessoa impotente, acuse-o de não ter fé em deus. Ela será obrigada a se retratar publicamente se quiser ter sua vida social de volta, correndo normalmente (hipocritamente).
Para a construção de uma sociedade mais justa e equilibrada, será que realmente ter fé é mais importante que possuir habilidades técnicos sociais e meritocracia? Se é tão importante ter fé, parece que essa tem surtido o efeito contrário pois a desordem crescente entre os que dizem possuir deus não condiz com a fé professada. Por outro lado, é notório que as “tribos” estão em constante conflito, invadindo o “território” uma das outros, usando todo tipo de clavas, para subjugar membros de um grupo para outro. Deve ser pelo motivo de termos entrado na era industrial e tudo pode ser comercializado, inclusive a fé.
Acuse o outro de não ter fé, julgue-o como um perdido e que precisa ser amparado e logo você terá clientes para o seu negócio.
CONTINUA...
Texto escrito em 13/11/17
*Antônio F. Bispo é graduando em jornalismo, Bacharel em Teologia, estudante de religiões e filosofia.
Por António Ferreira
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