segunda-feira, 27 de novembro de 2017

Erros e besteiras sobre o Big Bang




Introdução:

Há entre o público em geral um profundo desconhecimento sobre o que de fato significa a Teoria do Big Bang.

O principal problema está logo na leitura do enunciado da Teoria. As pessoas em geral leem que a Teoria se baseia na observação objetiva e clara de que o universo está em expansão em todas as direções.

As galáxias se afastam umas das outras em velocidades alucinantes.

Logo, tem que ter havido um tempo em que todo o universo estava concentrado no espaço de uma única galáxia.

Como não há NADA que impeça imaginarmos o processo continuando, temos de concluir que houve um tempo em que todo o universo estava concentrado no espaço de uma única estrela.

E assim por diante, temos de concluir que houve um tempo em que o universo inteiro estava concentrado num único PONTO.

A esse PONTO, o astrônomo e sacerdote católico Georges Lemaître deu o nome de “átomo primordial”. Nele estaria concentrada TODO o universo. Ponto final.

Isso em nenhum momento implica que o “átomo primordial” tenha “vindo do nada”, “sido criado por Deus” ou “vindo de outro universo”. A Teoria não pode prever nada disso. Será que isso ficou claro?

Então por que será que após ler essa descrição tão objetiva, as pessoas passam logo a fazer afirmações das mais estranhas e sem nexo? Isso é realmente um mistério para mim.

1 – O conceito filosófico de “Nada”.

O que é o “Nada”? Parece uma pergunta simples, mas na verdade não é.

Há várias definições filosóficas para o que seja o Nada, quase todas confusas.

Vamos tentar uma abordagem mais simples:

Imagine um lugar no espaço em algum tempo determinado. Imaginou?

Agora vá tirando TUDO o que tem lá. Tire os elementos sólidos, os líquidos, os gases, as radiações de todo tipo e no final retire até mesmo o tempo e o espaço. Isso seria o NADA.

Então o Nada existe? Na verdade, a resposta é NÃO. Simplesmente não existe uma forma de fazer o que eu descrevi. Não se pode tirar TUDO de algum lugar ou tempo. SEMPRE irá sobrar alguma coisa.

É o mesmo que o “número infinito”. O que é esse número?

Imagine um número MUITO grande. Imaginou? Ele é o “número infinito”?

NÃO. E por que não? Porque dado qualquer número, por maior que seja, sempre posso acrescentar a ele +1. E a esse +1 e assim eternamente.

Com o Nada é a mesma coisa. Sempre que você imagina o Nada, poderá pensar em lhe TIRAR mais alguma coisa. Daí não haver de fato um Nada de forma objetiva.

2 – A confusão de Krauss.

Lawrence M. Krauss é um físico e cosmólogo brilhante. Seu livro ““Um Universo que veio do nada: porque há criação sem Criador” foi um grande sucesso. Mas contem uma enorme “barbeiragem” em termos de filosofia.

O Krauss identificou o “Nada” dos filósofos como sendo algo parecido com o “Design Inteligente” dos criacionistas. De fato, ele diz no seu livro:

“O “design inteligente” é simplesmente um guarda chuva unificador para fazer oposição à evolução. Do mesmo modo, alguns filósofos e muitos religiosos definem e redefinem o “nada” como nenhuma das versões que cientistas descrevem atualmente” [1].

Como vimos anteriormente, essa não é a definição filosófica do “Nada”. Além disso, ele não se deu conta de que o conceito de “Creatio Ex Nihilo” (criação do nada) não está na Bíblia. É uma invenção de teólogos gregos para explicar o paradoxo de a matéria ser eterna juntamente com Deus. Se a matéria é eterna (como acreditavam os filósofos gregos) então não precisou ser criada. Não deve sua existência a Deus. Isso não parecia aceitável para aqueles piedosos doutores da Igreja.

Então o Krauss decidiu provar que o “Nada é alguma coisa” e “O nada é instável” respectivamente os títulos dos capítulos 9 e 10 do seu livro.

Isso se deve a uma forma de pensar um tanto estranha, ele escreveu:

“Claramente, o “nada” é tão físico quanto o “algo”, principalmente se for definido como a “ausência de algo”. Então cabe a nós entender exatamente a natureza física de ambos, E, sem a ciência, qualquer definição são apenas palavras” [2].

Esse é um erro em termos de filosofia. É como dizer que o número infinito de fato existe e pode ser definido de alguma forma como sendo um número inteiro e racional.

Em outras palavras, ele acabou por abrir uma enorme brecha para as críticas dos religiosos de que ele e outros “cientistas ateus” defendiam que o “universo veio do nada”. A inconsistência dessa abstração dos teólogos acabou se virando contra ele!

Não podemos dizer que o “Nada” é “físico”, lhe dar vários atributos e esperar que ele continue a ser nada...

3 – O que é afinal o BIG BANG?

A Teoria do Big Bang se baseia em algumas ideias relativamente simples e objetivas. Todas elas fruto de observações e matemática e não de especulação ou devaneios.

Há séculos se discutia se o universo era estático, ou seja, sempre foi do jeito que é, ou não.

Toda a Teoria da Gravitação de Isaac Newton se baseia em um conceito de universo estático. Esse universo seria assim desde sempre e o seria para sempre.

Como surgiu? Como Newton e seus amigos não queria “pagar de ateus”, desenvolveram o que se chamou de “deísmo”. O universo é uma espécie de relógio mecânico muito preciso e que surgiu a partir de um “Criador” que só o pôs para funcionar, mas depois se afastou e ninguém mais soube dele. “Se subiu, ninguém sabe, ninguém viu...”

Essa visão de mundo se manteve até Albert Einstein desenvolver a Teoria da Relatividade e escrever certas equações que lhe dão uma bela sustentação matemática.

Mas foi aí que surgiram dois caras muito chatos. Um era o russo Alexander Friedmann e o outro o padre católico Georges Lemaître. E o que foi que eles fizeram?

Bom. Eles pegaram as equações de Einstein e lhe colocaram ‘valores extremos” para ver se elas lhes podiam dizer sobre o passado do universo. E o resultado foi surpreendente:

Segundo as equações, o universo não era estável, mas tinha surgido de algum ponto inicial e se expandia constantemente. O padre até inventou um nome legal para o começo do universo: O “átomo primordial”.

A ideia parecia doida? Para Albert Einstein parecia. Ele disse aos dois que esquecessem o assunto porque estava desenvolvendo uma nova teoria que “explicaria” que o universo de fato era estável.

Depois ele publicou seu trabalho sobre a “Constante Universal” que resultaria que certas forças que equilibrariam a força da gravidade e manteriam o universo, belo e formoso, sempre estático.

Mas aí surgiu um cara mais chato ainda. Ele se chamava Edwin Hubble e, mesmo sem saber nada sobre o russo e o padre chatos, descobriu que todas as galáxias estavam se afastando umas das outras.

Como ele fez isso? Você já teve ter percebido que se uma ambulância ou carro de polícia passa por você, o som da sirene parece mais agudo quando ele vem e depois vai ficando mais grave quando ele se afasta.

Isso acontece porque quando ela se aproxima, as ondas sonoras se somam a velocidade do carro e quando se afastam se subtraem. Isso é chamado de “Efeito Doppler” e você já aprendeu isso com a Tia no ensino fundamental.

O efeito também acontece com a luz. E no caso, o que está se aproximando vai ficando mais azul e o que se afasta mais vermelho. É o “desvio para o vermelho”. E o nosso amigo Hubble descobriu que isso acontecia com todas as estrelas de todas as galáxias. Só podia haver uma conclusão: As galáxias estavam todas se afastando umas das outras.

E se é assim agora, então no passado tinham de estar todas juntas, na verdade muito juntas, exagerando, tinham de estar tão juntas que toda a massa e toda a energia do universo tinham de estar num único ponto “infinitamente denso e quente”.

Isso provou que o russo e o padre estavam certos e o bom professor Einstein estava errado. Isso é a Teoria do Big Bang.


4 – Um filme passado de trás para diante.

Outra forma de explicar o Big Bang é imaginar que estamos vendo a expansão do universo “de fora” dele. E não só isso, estamos vendo o processo todo acontecer ao contrário, de trás para diante, como num filme rodando do fim para o começo.

O que veríamos? Bem, as galáxias agora estão se aproximando umas das outras.

Num dado instante elas acabam por se entrelaçar e as estrelas começam a colidir umas com as outras formando objetos cada vez mais massivos.

Uma coisa interessante e muito importante é que a MASSA e a ENERGIA do universo permanecem a mesma. Embora a massa e a energia de vários corpos celestes se fundam e se transformem, a quantidade total de massa e energia permanece sempre a mesma.

Nosso filme ao inverso será um espetáculo espantoso de compressão de tudo o que existe em objetos cada vez menores e cada vez mais massivos. O volume do universo se reduz de forma dramática, mas sua densidade vai aumentado. A energia se condensa, mas a temperatura geral também vai aumentando.

Num dado momento mesmo os átomos se fundem em aglomerados de partículas subatômicas (qharks, elétrons, neutrinos e suas partículas) de onde nem os fótons mais conseguem escapar. Daí em diante não poderíamos ver mais nada.

Isso não significa que o universo tenha “virado nada”. Não. Ele estaria todo concentrado em algo que o Georges Lemaître chamou de “Átomo primordial”. Trata-se de “uma única partícula maciça de densidade infinita”. [3].

“Uma extrapolação da expansão do universo no passado, usando a relatividade geral, produz uma densidade e uma temperatura infinitas em um tempo finito.” [4].

Ou seja, em nenhuma das narrativas sobre a Teoria do Big Bang se diz que o universo “veio do nada”. Até porque como vimos no nosso “filme ao contrário”, é a própria MATÉRIA do universo que se junta de forma a formar o tal “átomo primordial”.

E é essa mesma MATÉRIA que se expande numa grande “explosão” ou, segundo teorias mais recentes, “inflaciona” de forma espetacular.

Visto isso, vamos deixar de uma vez por todas com essas afirmações descabidas de que o Big Bang é uma teoria que prevê que o universo “veio do nada”. E pior ainda que foi “criado” por algum “ser superior”. A Teoria, como vimos, não tem nada a ver com isso.




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[1] “Um Universo que veio do nada: porque há criação sem Criador” / Lawrence M. Krauss – São Paulo: Paz e Terra, 2013. Página 12.
[2] Idem, inclusive a página.
[3] “Teoria do Big Bang” – Toda Matéria.
[4] “Big Bang” – Wikipédia.

2 comentários:

  1. Maravilhoso !! De uma forma simples e objetiva essa explicação, só não entende quem não quer. Parabens !!

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