segunda-feira, 5 de fevereiro de 2018

Desmontando a bíblia - O nascimento de Jesus em Belém.




As narrativas evangélicas segundo as quais Jesus nasceu em Belém são exemplos de “profecia historicizada”, para fazer-se cumprir forçadamente a profecia de Miqueias do Antigo Testamento, a qual dizia que o esperado Messias nasceria em Belém: “Mas tu, (Belém), Éfrata, embora pequena entre os clãs de Judá, de ti sairá para mim aquele que será dominador em Israel. Suas origens são de tempos antigos, de dias imemoráveis” (Miqueias 5,1). A versão de Mateus é esta: “E tu, Belém, terra de Judá, de modo algum és a menor entre os cidades de Judá, pois de ti sairá um que será o guia que apascentará Israel, o meu povo” (Mateus 2,6).

Primeiramente, o caro leitor deve notar a proposital modificação da linguagem dessa profecia que o escritor do Evangelho segundo Mateus fez. Miquéias diz "Belém Efrata" que muito provavelmente seja um clã (grupo de certos indivíduos), ainda que esse clã seja de judeus. Mateus substitui "Belém Efrata" para "Belém da Judeia" o que seria uma grave distorção da linguagem, quiçá para casar com doutrinas cristãs previamente estabelecidas.

A esse respeito, há contradições nos próprios Evangelhos acerca da cidade onde Jesus nasceu: enquanto para Mateus e Lucas, Jesus nasceu em Belém, para João, ele nasceu em Nazaré. O Evangelho de João afirma textualmente que os seguidores de Jesus ficaram surpresos com o fato de ele não ter nascido em Belém:
"Diziam outros: “É este o Cristo!” Mas alguns diziam: Porventura pode o Cristo vir da Galileia? A Escritura não diz que o Cristo será da linhagem de Davi e virá de Belém, a cidade de onde era Davi? (João 7,41-42)".

Embora Mateus e Lucas afirmem que Jesus nasceu em Belém, existe uma famosa contradição entre eles: enquanto para Mateus, Maria e José residiam em Belém, desde sempre, tendo ido morar em Nazaré só muito tempo depois do nascimento de Jesus, na volta do Egito, para onde tinham fugido do rei Herodes e do massacre dos inocentes, Lucas, ao invés, admite que Maria e José moravam em Nazaré antes de Jesus nascer, tendo ido para Belém, somente para cumprir a profecia de Miqueias, na época em que Quirino era governador da Síria, e quando César Augusto tinha ordenado a realização de um censo, e todo mundo tinha de ir “para a sua cidade”. José era supostamente “da casa e da linhagem de Davi” e, portanto, tinha de ir para a “cidade de Davi, que é chamada de Belém.

Do ponto de vista histórico, é uma grande mentira afirmar que César Augusto ordenou a realização de um censo, e todo mundo tinha de ir “para a sua cidade”. Um recenseamento parcial, ordenado por Quirino, governador da Síria, realmente aconteceu, mas somente seis anos depois do suposto nascimento de Cristo em Belém, quando Herodes, o Grande, ainda era rei (cf. Mateus 2,16). Acontece que Herodes morreu no ano 4 antes de Cristo, portanto, cerca de uma década antes do recenseamento ordenado por Quirino.

É um grande erro acreditar que os romanos teriam exigido que José voltasse para a cidade de Belém, onde um ancestral remoto (o rei Davi) havia "vivido" um milênio antes.

Sem deixar aqui de realçar que muitos estudiosos atestam que a cidade de Nazaré no primeiro século da nossa era nem existia. Agora ficou feio, mas pela natureza polêmica desse assunto, isso não será aqui discutido, e deixo aqui essa curiosidade pra que você que acompanha a minha série possa investigar a respeito.

Continuando...

A genealogia de Jesus rastreada por Mateus e Lucas é muito contraditória: Enquanto para Mateus, a descendência de José do rei Davi é feita por 28 gerações intermediárias, Lucas fala em 41 gerações, sem que haja coincidências nos nomes das duas listas. De qualquer jeito, se Jesus nasceu mesmo de uma virgem, por obra e graça do Espírito Santo, conforme a crença mítica no nascimento virginal e miraculoso de Jesus, os ancestrais de José seriam irrelevantes e não poderiam ser usados para fazer cumprir, a favor de Jesus, a profecia de Miqueias de que o Messias deveria ser descendente de Davi.

Como disse num post anterior, os cristãos nunca aceitam de bandeja serem desnudados (falo por experiência). A maior defesa pra as contradições destas genealogias é de que Mateus fala da genealogia de José e Lucas fala de Maria. Discordo veementemente com essa alegação, mas deixo isso pra um outro possível post.


Texto de Gil Yossuf

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