domingo, 5 de março de 2017

Jesus? Qual Jesus?



Se você tivesse uma máquina do tempo e voltasse para a Palestina judaica do começo do século 1 em busca de Jesus, iria ter dificuldades para encontrar o Jesus certo. Para todo lugar que olhasse, veria líderes religiosos, profetas e curandeiros. Alguns contavam com mais seguidores que Cristo. E um deles tinha até o mesmo nome.

A profusão de místicos não era uma situação corriqueira para os judeus. Depois de 400 anos de relativo silêncio na religiosidade popular judaica, Jerusalém e seus arredores estavam cheios de pessoas prometendo saúde, prosperidade, liberdade ou vida eterna. Jesus era só mais um deles.

Apolônio de Tiana passou poucas vezes pela cidade mais importante do judaísmo, mas seus ensinamentos foram espalhados por ali e todo o mundo conhecido no período, da Espanha à Índia. Simão, o Mago, curava doentes, tinha centenas de seguidores e, dizia-se, conseguia levitar. Banus vivia isolado do mundo e organizava rituais complicados de purificação com água – assim como João Batista, outro profeta mais popular do que Cristo em sua época. Eleazar fazia sessões de exorcismo à base de espirros. Simão, o Essênio, era especialista em interpretar sonhos. Já Jesus, filho de Ananias, quase teve o mesmo destino de Jesus de Nazaré.

Ao longo do 1º século da era cristã, pelo menos 10 pessoas diferentes se declararam “messias”, expressão que significa “o consagrado” e remete à profecia de um descendente do rei judeu Davi que iria reconstruir Israel em toda a sua força. É por isso que os Evangelhos dizem que Jesus nasceu em Belém, a terra de origem do rei mítico, enquanto os historiadores acreditam que ele veio ao mundo em Nazaré, na época um pequeno vilarejo de apenas 500 habitantes.

A região era um cadinho de seitas e crenças. Os judeus estavam lá, mas também havia a influência do mitraísmo persa e de cultos anímicos (sem contar os egípcios e seus deuses, ali pertinho). A invasão romana catalisou pregadores que anunciavam o apocalipse, que se misturavam a exorcistas e todo tipo de curandeiro. Na página ao lado e nas próximas, você vai conhecer alguns dos mais influentes.

1. Apolónio de tiana
Os relatos sobre Apolónio, que datam do século 3, o apresentam como um grande filósofo e um dos profetas mais populares do século 1 – muito mais do que Jesus. Nascido por volta de 2 a.C., foi educado segundo os princípios de Pitágoras. Aos 20 anos de idade, fez um juramento de silêncio por 5 anos. Depois, teria viajado até a Índia. Na volta, passou por Roma e Grécia, onde foi recebido como mágico e curandeiro, capaz de ressuscitar mortos. Construiu uma escola em Éfeso (Turquia), onde repassou seus ensinamentos, incluindo uma dieta vegetariana, até morrer, em 98. Seus discípulos continuaram ativos por pelo menos 150 anos.

2. Simão, o Mago 
No livro bíblico dos Atos dos Apóstolos, Simão tenta comprar dos discípulos de Jesus o poder de fazer milagres. Nos Atos de Pedro, ele levita, até que Pedro reza para que ele caia no chão” sua perna quebra em três lugares e ele morre em consequência dos ferimentos. Tanta atenção em textos bíblicos indica que o profeta era concorrente dos cristãos. Nascido na Samaria, pregou seus ensinamentos desde o Egipto até Roma, incluindo a Palestina, e deixou seguidores, os simonianos, que só desapareceram no século 4. Para Simão, existiam duas encarnações de Deus na Terra. Ele era uma delas e a outra era Helena, uma prostituta com quem se casou.

3. Honi 
Chamado “traçador de círculos”, por ter o hábito de meditar desenhando na areia, Honi Ha-M’agel era considerado por alguns rabinos o filho de Jeová enviado à Terra. Vivia isolado e comia o menos possível. Em uma de suas orações dentro do tal círculo, interrompeu um longo período de seca. Na ocasião, teria discutido com Deus, dizendo que só sairia do lugar se chovesse – e ainda reclamou da qualidade da chuva. O Talmude, o livro sagrado judeu, diz que ele caiu em um longo sono de 70 anos e depois despertou. Também era conhecido como grande estudioso. Como Jesus, atribuía seus milagres à fé de quem os pedia.

4. João Batista 
Primo de Jesus, de acordo com o Evangelho de Lucas, foi quem o batizou, no rio Jordão. Como líder religioso, João preparava seus discípulos para o fim do mundo. De acordo com o Novo Testamento, vestia peles, comia mel e gafanhotos e era tratado como uma reencarnação do profeta Elias. Era muito mais popular do que Jesus. Nascido em 2 a.C., em uma aldeia nos arredores de Jerusalém, morreu no ano 27 a mando de Herodes Antipas 1º (10 a.C. 44), governador da Judeia. Seus discípulos eram numerosos e mantiveram uma religião por 3 séculos. A forma como João praticava o batismo foi incorporada pelos discípulos de Jesus.

5. Jesus de Ananias 
Jesus era um nome muito comum na Palestina da época” tanto que, no ano 63, o sumo-sacerdote Jesus, filho de Damneu, foi substituído por Jesus, filho de Gamaliel. O Jesus filho de Ananias veio da zona rural e, em 62, circulou pelas ruas de Jerusalém profetizando a destruição do templo (a profecia se cumpriria 8 anos depois). De acordo com o historiador Flávio Josefo, ele repetia, aos gritos: “Uma voz do oriente, uma voz do ocidente, uma voz dos 4 ventos; um voz contra Jerusalém e o santuário, uma voz contra o noivo e a noiva, uma voz contra o povo!” Foi levado a julgamento, mas acabou inocentado por ser considerado louco.

6. Banus Eremita
Viveu no deserto da Judeia em meados do século I. Dormia ao ar livre, sem se proteger do frio ou dos animais, a quem tratava com reverência. Vestia folhas e cascas de árvores e se banhava com água gelada o tempo todo” cada banho era cheio de rituais complicados, que tinham o objetivo de purificar corpo e alma na preparação para o fim do mundo. Tinha um pequeno grupo de seguidores, a quem anunciava que o apocalipse estava próximo e era preciso abandonar qualquer apego por prazeres mundanos. Seus discípulos não eram bem organizados e acabaram se dispersando depois que ele morreu.

7. Eleazar 
O exorcista mais famoso da Palestina na 2ª metade do século 1. Chegou a retirar demónios de um grupo inteiro de pessoas na frente do imperador Vespasiano (9-79). O ritual consistia em colocar, debaixo do nariz do possuído, um anel recheado de raízes que teriam sido prescritas pelo rei Salomão. O cheiro forte levava a pessoa a espirrar várias vezes e o espírito saía pelo nariz. Para dar impacto à cena, Eleazar colocava uma bacia de metal cheia de água – ao ser expulsa, a entidade derrubava o líquido e a bacia com grande estrondo. Seu diálogo com os demónios lembra as frases de Jesus Cristo, um exorcista reconhecido.

8. Hanina ben dosa 
Nasceu e viveu em Arava, a 19 km de Nazaré. Devoto da fé judaica, rezava com tanta intensidade que, conta-se, certa vez não percebeu que uma cobra venenosa havia mordido seu pé. Mas ele ficou bem e a cobra morreu. Curiosamente, no Evangelho de Lucas, Jesus diz: “Dei-lhes o poder de pisar em serpentes, e nada poderá lhes causar danos”. Como o texto foi escrito entre o fim do século 1 e o começo do 2, é possível que o autor tenha feito referência ao famoso profeta. Hanina tinha fama de fazer chover, de curar pessoas a distância e de fazer renascer árvores e animais. Viveu e morreu na miséria.

9. Enahem, o Essênio 
Respeitado pela capacidade de fazer profecias, encontrou Herodes e o saudou como o “futuro rei dos judeus”. Quando, de fato, alcançou o cargo, Herodes (73 4 a.C.) transformou Menahem em consultor. Viveu cercado por um pequeno grupo de seguidores, a quem ensinava a arte de realizar profecias. Depois que Herodes morreu, tentou conspirar contra os romanos. Foi perseguido, julgado e crucificado. Seu corpo foi jogado na rua. Para o historiador Israel Knohl, autor de The Messiah Before Jesus (O Messias Antes de Jesus), Jesus conhecia bem a história de Menahem e queria para si um destino parecido.

Fonte e artigo completo: Fontes na História

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